Tenho convicção: não sou
o melhor exemplo para falar do tema. Dos meus 54 anos de idade, fui aculturado
misoginomachisticamente, talvez, uns 30 a 40 anos. Ao ingressar na Universidade
Federal do Amazonas (UFAM), em 1985, ainda como estudante do Curso de Comunicação
Social (Habilitação em Jornalismo), tive os primeiros contatos com a professora
Conceição Derzi. Foi com ela que tomei as primeiras doses de antídotos
antimisoginia e antimachismo. Tenho plena consciência de que não estou curado.
Ainda preciso tomar, todos os dias, doses cavalares de medicação tarja-preta,
para não ter recaídas. Convivo com machistas o tempo inteiro. Mas, hoje em dia,
por conta das doses cavalares de consciência do meu papel de educador, combate,
a cada segundo o machismo e a misoginia, como um viciado que se recupera
permanentemente, para não deixar que doses tóxicas circulem pelo meu sangue. Dias
desses, jogava dominó com os amigos, na beira da churrasqueira. A TV estava
ligada justamente naquela emissora que, segundo todos eles, “só mostrava o que
não prestava e era um ataque frontal às famílias brasileiras”. Isso no momento
que os personagens gays apareciam ou quando mãe e filha “pegavam” o mesmo
homem. Não falei nada: só ouvia e deixava cada um destilar o seu veneno. Sobre
um tal “programa dos Brothers” os comentários eram os mesmos. De repente, cenas
deste dito “programa que destrói a família brasileira” entram no ar. Cenas de
mulheres em trajes mínimos. Olhos esbugalhados, os mesmos críticos de há pouco,
só falavam nas qualidades das “gostosas”. Não me contive: “quer dizer que para
vocês, quando aparecem cenas de gays e de mulheres com comportamento sexual
nada convencionais, a família brasileira está em perigo, é? Agora o programa
condenado há pouco é o melhor do mundo? Gostariam muito que vocês mantivesse a
coerência do discurso. Caso não, tudo o que falaram antes é pura hipocrisia”. E
o fiz com o tom de voz muito mais alto. Uns concordaram e ficaram sérios.
Outros, riram e disseram que eu tinha sido radical demais. Talvez a minha reação
indignada, ate no tom da voz, tenha servido pouco. Mas, se provocou algum tipo
de reflexão naqueles machistas inveterados, terei cumprido, em parte o meu
papel de educador. Tenho certeza que não mudarei o mundo machista e misógino. O
que posso fazer é provocar ranhuras nas mentes machistas. Assim fazendo, tento
me redimir dos meus pecados machistas do passado e ser uma pessoa melhor no
futuro. Não sei se conseguirei. Porém, tento todos os dias!
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