Há uma crença,
quase uma lenda, de que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes) é a responsável pela qualidade (ou não) da Pós-graduação no
Brasil. É como se a Capes fosse uma entidade abstrata, com toque de Midas,
capaz de transformar programas medíocres em programas de excelência. Trata-se
de um engano histórico e conceitual. A Capes é resultado de um trabalho
coletivo acumulado ao longo dos anos com a finalidade de construir indicadores
capazes de avaliar os programas de Pós-graduação e servir de base para a
autorização de novos programas. A Capes, portanto, não é uma abstração
terrorista que centra o foco em torturar constantemente professores em seus
locais de trabalho. O dito produtivismo é uma exigência dos próprios pares
(professores e professoras) para avaliar "quem pesquisa e quem publica
artigos, livros ou capítulos de livros" no Brasil. Acontece que a produção
é apenas um dos componentes da complexa cesta de critérios da "avaliação"
da Pós-graduação no Brasil. Há componentes tangíveis e intangíveis. Dentre os
tangíveis, a produção se nos apresenta, sim, com um peso, talvez excessivo, a
se levar em conta as demais atividades, principalmente administrativas,
desenvolvidas por um doutor (ou doutora) dentro de uma Instituição de Educação
Superior (IES). E porque digo talvez? Pelo simples fato de, também, não concordar
que seja exagero cobrar de um doutor, ligado a um programa de Pós-graduação,
que publique, pelo menos, dois artigos, ou capítulos de livros (ou um combinado
com o outro) a cada ano. Desde quando manter uma média dessas ao longo de três
anos é "produtivismo"? Aqui, entra um componente fundamental, que ousei
chamar de intangível: o comprometimento dos professores e professoras que fazem
parte dos programas de Pós-graduação em cada uma das universidades públicas
brasileiras. E vem acompanhado de uma pergunta basilar: o que leva um professor
ou professora a se credenciar em um programa de Pós-graduação? O gosto (melhor
falar em amor) pela Pesquisa? A oportunidade de desenvolver um valoroso
trabalho em equipe? Ou o simples desejo de ostentar a marca
"Pós-graduação" para engordar seu Lattes e, com isso, conseguir
ampliar as possibilidades de realizar consultorias e negócios particulares?
Quando entram em jogo as duas primeiras questões, dificilmente o professor (ou
a professora) reclamará acintosamente da "obrigação" de publicar dois
artigos por ano. Quem efetivamente ama o que faz, envolve-se com a pesquisa e
seu objeto. Logo, publicar será um prazer e não uma tortura. Assim como, se o
comprometimento é com o trabalho em equipe, é pouco provável que publicar dois
artigos por ano passe a ser visto como uma tortura. Resta um componente que tem
a possibilidade de funcionar como uma bomba de efeito retardado e minar, até
implodir por dentro, todo o esforço coletivo que houver para que os programas
de Pós-graduação atinjam a excelência nas universidades brasileiras: o uso da
marca "pós-graduação" com fins particulares. E sabem quando isso
acontece? Quando o professor (ou a professora) cumprem fielmente os editais de
credenciamento dos programas, apresentam os projetos de pesquisa e prometem, de
pés juntos, que cumprirão à risca tudo o que constar nos Regimentos Internos.
Fazem-no, porém, como aquele pecador que, diante do padre, jura (ao padre e a
si mesmo) nunca mais pecar. Sai, no entanto, da Igreja, a rir do padre e de si
mesmo por acreditarem em mais uma promessa vã: não publica, não comparece às
reuniões, não colabora diretamente com a Coordenação dos Programas e age como
se fosse mero "ministrador de aulas" (quando se digna a ministrar
alguma disciplina) ou orientador. Não seria mais justo e honesto pessoas com
este tipo de perfil pedirem para sair? Não o fazem, no mais das vezes, porque
perder a etiqueta no programa de Pós e da Universidade no qual o programa
funciona é reduzir quase ao nada a possibilidade de realizar consultorias. Quem
assim age enterra os programas de Pós dos quais participa e, indiretamente,
transforma a Capes em uma entidade abstrata que só cobra produtividade dos
programas, consequentemente dos seus professores. Esquece que a Capes não tem
vida. E que os que a formam são professores e professoras como nós, que já
participaram (ou ainda participam) de algum programa de Pós-graduação. Suas
regras e seus indicadores são estabelecidos por nós, em cada um dos Comitês de
Área. Ora, se os critérios e indicadores são excessivos, irreais, que os nossos
pares, em cada Comitê, sejam instigados a modificá-los. Eles são a face
tangível de uma moeda que tem na outra face, o intangível, ou seja, o
comprometimento dos professores e professoras que fazem parte dos programas. Só
se atinge a excelência quando, como na Filosofia Chinesa, Yin e Yang, essas
duas energias extremamente poderosas, entram em equilíbrio. Sem isso, o
"produtivismo" e, por tabela a Capes, serão sempre o vilões.
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