Quando
da época da campanha para a escolha dos novos dirigentes (ou a manutenção dos
atuais) das universidades federais, como é o caso, agora, da Universidade
Federal do Amazonas (Ufam) sempre ouço a mesma ladainha: "Vou examinar bem
a proposta dos candidatos e o projeto de universidade. Porém, só voto em quem
me deixar trabalhar". É preciso, no entanto, estar bem-preparado para
decifrar a mensagem não dita. "Quem me deixa trabalhar" é o candidato
que fizer vistas grossas, ou defender abertamente, a "prestação de
serviços" por parte da universidade pública brasileira. Incentivados pelo
próprio Governo Federal, que há 20 anos não libera verbas de manutenção e
custeio, professores, técnicos e até estudantes se viram obrigados a entrar na
roda-vida do "capitalismo de estado". Os Grupos de Pesquisas, que, inicialmente,
deveriam ser o local do desenvolvimento da pesquisa com o fim de melhorar a
vida das pessoas, ou seja da sociedade, transformaram-se em meros escritórios
de negócios, dentro das próprias universidades. Ou para concorrer aos editais
do Governo e das agências de fomento ou para a prestação de serviços, às vezes
aos governos Estadual e Municipal, às vezes às empresas particulares. Ensino,
Pesquisa e Extensão, tidos como o tripé da universidade brasileira, passam a existir
para servir aos interesses não da coletividade, mas, dos feudos internos (dos
dois ou três professores [e professoras] que o comandam). Ao fim desse ciclo de
"negociações", o que se tem, efetivamente, é a Ciência completamente
contaminada pelas relações incestuosas com o capital. Não sou daqueles
chatoxiitas das universidades brasileiras que não aceitam nenhum tipo de
financiamento que não seja público. Creio que há alguns tipos de serviços de
consultorias e cursos que podem sim, ser prestados pelas universidades. Não
creio, porém, que um Relatório de Impacto Ambiental, resultado de um acordo
firmado entre uma universidade pública e uma Petrobrás, por exemplo, seja
isento. Sem duvidar, em nenhum momento, da honestidade das pessoas que
participam desse tipo de serviço, vejo que a Ciência sofre interferência sim.
Que os relatos resultados desse tipo de contrato, quer para gasodutos, pontes e
estradas, jamais levarão em conta os interesses das comunidades, da sociedade.
Serão sempre produzidos com o fim de "ajudar" a empresa (ou o
Governo) a obter a licença ambiental que deseja. Por mais otimistas que
sejamos, das ações prometidas como fim de mitigar os danos, poucas saem do
papel. Tornam-se ornamentos dos tais relatórios. E isso é apenas um dos exemplo
de que a Ciência, ou seja, a pesquisa, é contaminada pela prestação de
serviços. Uma universidade pública é financiada com recursos públicos. Deveria
sim, fazer todo o tipo de acordo com a finalidade de servir os entes públicos e
melhorar a vida das pessoas. Quando até o espaço físico das universidades e os
recursos públicos são usados apenas para melhorar a vida de determinados
professores e professoras talvez possamos entender a luta suja que se instala
para se chegar ao poder ou a ele voltar. Precisamos repensar urgentemente o
modelo de universidade que aí está. A cada greve o Sindicato Nacional dos
Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) aponta as contradições
do modelo atual. Ao final da greve, quando voltam para as suas atividades e se
deparam com o processo de escolha dos dirigentes, professores e professoras
parecem esquecer tudo o que discutiram e o modelo que criticaram. Grupos que
representam a afirmação do modelo que aí está deveriam ser rifados nas
disputas. Curiosamente, são os que mais conseguem votos. Talvez, porque, no
fundo, são aqueles que "deixam trabalhar".
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