sábado, 19 de janeiro de 2013

Parfor: cinismo e cretinice na universidade brasileira


Parece haver um certo cinismo, quiçá não seja cretinice, na universidade pública brasileira. Durante a greve de 120 dias dos professores e professoras, grande parte da categoria fez discursos veementes contra o Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor). Hoje, porém, não sei a realidade das demais universidades brasileiras, mas, na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), a maioria absoluta dos professores viajou ao interior para ministrar disciplinas no Programa. Do ponto de vista financeiro, é uma mina. Além dos salários que recebem ao final do mês, professores e professoras que participam do Parfor são agraciados com a seguinte remuneração: para disciplinas de 40h, recebem quatro bolsas de R$ 1.300,00, ou seja, um total de R$ 5.200,00. Se a disciplina fora de 60h, são seis bolsas de R$ 1.300,00 durante seis meses, o que dá um total de R$ 7.800,00. Cada professor ou professora pode participar de até duas disciplinas. Para ter direito a uma das duas modalidades de bolsa o professor ou professora precisa passar 15 dias em uma cidade do interior do estado. Em 30 dias, um professor (ou professora) pode acrescer ao seu salário duas bolsas de até R$ 7.800,00, o que perfaz um total de R$ 15.600,00. Só que, para fazer jus a esse montante, professor ou professora devem deixar seus estudantes da sede sem, no mínimo, 30 dias de aulas, uma vez que não pode ministrar duas disciplinas, ao mesmo tempo, no Parfor. Até aqui, tocamos apenas na questão financeira. Nessa perspectiva, para professores e professoras mal-remunerados como somos, é o que se pode chamar de "mão na roda". Do ponto de vista pedagógico, porém, é a comprovação do cinismo, da cretinice e da mediocridade levados ao extremo. O mesmo professor que, na capital, ministra a disciplina em quatro meses e reprova a maioria da turma, sai para um Parfor, quando tem de ministrar até nove horas diárias da mesma disciplina e aprova todos os estudantes. Há algo de errado no reino da Dinamarca. Enquanto, em Manaus, dos 5.500 estudantes que ingressam na Ufam, 30% (trinta por cento) são reprovados, no Parfor, são 100% de aprovação. Oras, não se precisa ser nenhum ser inteligente para perceber que, do ponto de vista do Ministério da Educação (MEC) e da política pública em vigor, o melhor é que a universidade brasileira inteira se transforme em um grande Parfor. Para se chegar aos resultados exigidos pelo MEC, o melhor mesmo é que cada disciplina seja um Parfor. Imaginem o que seria um disciplina, em apenas 15 dias, com 100% de aprovação? É tudo o que o MEC quer. Depois de 15 dias os professores e professoras ficariam livres para desenvolver atividades de Pesquisa e Extensão. Se não somos crápulas e enganadores, o melhor modelo é o do Parfor que, em 15 dias, ministra uma disciplina de até 60 horas com 100% de aprovação. Não sejamos cretinos! Isso é um modelo que, pedagogicamente, é a maior enganação da universidade brasileira. Serve aos interesses eleiçoeiros do Governo Federal mas, do ponto de vista didático-pedagógico, é assumir a mediocridade como regra. Sejamos menos cretinos e assumamos que enganar estudantes e a população é a melhor política e criemos um Parfor para Manaus. Assim, cada disciplina da Ufam será oferecida em 15 dias com aprovação total. Em não sendo assim, peitemos o Governo Federal e não aceitamos esses programas que nos colocam em disputa constante com os colegas pelos minguados reais de remuneração. Sejamos, no mínimo, honestos conosco e deixemos de criticar esses programas "meia-bocas" do Governo. É o que se espera de quem realmente defende uma universidade pública, gratuita e socialmente referenciada. Quem se torna escravo desses programas como forma de complementar os salários não moral para criticar ninguém. E quem defende esse modelo nefasto de universidade que não me venha pedir apoio na candidatura para reitoria, Candidatos que representam e defendem esse modelo de universidade não terão o meu apoio. Defendo uma Ufam e uma universidade brasileira diferente deste modelo neoliberal que aí está. Reflitamos sobre esse modelo que usa programas como forma de engordar salários. Empurra para a morte da universidade pública brasileira e questiona qualidade dos cursos na capital. Reprovar aqui uma média de 30% de estudantes aqui em Manaus e aprovar o total no Parfor é cretinice. Que não aceitemos essa prática como normal.

Se você ainda não leu a “Carta aberta ao secretário Sérgio Mendonça”, cliquei aqui, leia e replique. Todos precisamos refletir sobre o problema. Juntos!

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